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por Nereide Michel em 25/11/2022

20 de novembro. Dia da Consciência Negra. Ou deveria ser o dia da consciência não negra? A data foi concebida – essencial e necessariamente – para servir de reflexão sobre o lugar ocupado e o papel desempenhado na sociedade por uma expressiva parcela da população brasileira de iguais direitos, vocações, habilidades e capacidades de seus conterrâneos. No no entanto, ela continua marginalizada do contexto socioeconômico que formata o Brasil como nação. É o dia, portanto, de ampliar vozes, aguçar ouvidos, arregalar os olhos, com mais força e poder decisório, para que os motivos da efeméride prescrevam por “prazo de validade vencido.

Em contraste com uma realidade, que  invisibiliza e marginaliza cidadãos que compartilham da mesma origem pátria, a cultura gerada nesse nicho populacional é conhecida, reconhecida, aplaudida e elogiada de forma generalizada e, sem contestação, integrada ao cotidiano dos brasileiros. Música, teatro, dança artes plásticas, cinema… Independente de cor da pele seus autores, ninguém duvida, são brasileiros!

Domingo, 20 de novembro de 2022. A mais importante e tradicional casa de espetáculos curitibana, o Teatro Guaíra, abriu as cortinas com o objetivo de conscientizar a todos que a presença dos autores negros no cenário cultural brasileiro é onipresente, marcante e influente. No seu palco o projeto Pret¡!n Move que, como o nome define, é movimento, como o das notas musicais, o dos passos dos bailarinos, o das mãos esboçando ideias no papel. Iniciativa dos  bailarinos do Balé Guaíra Luana Nery, Rodrigo Leopolldo e Leonardo Lino, o evento teve como objetivo celebrar o orgulho preto, mostrando ao público toda a criatividade, o talento e a relevância do caldo cultural de matriz africana. 

O evento ocupou um espaço, ao qual geralmente apenas os artistas têm acesso. Atrás das cortinas do palco. Foi uma primeira edição, com um formato intimista – mas não tímido – para evidenciar a proposta de uma luta em busca de igualdade manifestada através da cultura. O primeiro passo se mostrou certeiro no alvo dos seus objetivos. A próxima edição, certamente, terá o passo mais alargado: os atores, autores e personagens do Pret¡!n Move vão ocupar todo o palco do Teatro Guaíra e sob os seus holofotes irão ganhar aplausos de uma plateia lotada!

EM MOVIMENTO

O projeto/espetáculo do Pret¡!n Move , apresentado no Dia da Consciência Negra, começou a desenrolar sua bandeira exibindo dois vídeos que contextualizam a arte negra no cotidiano urbano. A diversidade da programação atestou a versatilidade dos autores e personagens na performance de variadas manifestações da cultura.

 Inês Drumond, pianista e integrante da Cia. G2 do Teatro Guaíra, e Jurandi da Silva, professor do Balé Teatro Guaíra – uma sensível apresentação ao som de “What a Wonderful World”.

Adrielly Faria interpretou quatro canções autorais do seu repertório. Toda forma de amor vale a pena!

Ao som da DJ Lo Pimentel, Pret¡!n Move virou passarela para destacar a criatividade preta na moda. Os tecidos do artesão senegalês Ndiaga Faye ganharam os holofotes com vestidos e túnicas. Três dos looks apresentados foram produzidos pela figurinista Michelle Porto para a peça “O Céu de Mahura” com tecidos étnicos de Faye.

O coletivo Brechó das Preta entrou na passarela com ênfase na produção de moda e na diversidade de corpos, idades e gênero. O coletivo é formado pelos brechós Makeda Brechó (Karoline Alves Pessoa e Patrícia Alves Pessoa), Brechó Kaw Black (Kaoane M S Epifanio) e Brechó Se Garimpô Levô  (de Maria Gabriela dos Reis Ferreira  e Elza dos Reis Bernardes). A De Benguela forneceu apliques naturais para realçar a beleza dos modelos.

Brechó das Preta fechou sua entrada com Patrícia Alves Pessoa, o marido Alysson Elienay e o pequeno Zion, filho do casal de apenas 7 meses. 

A marca autoral Chris Preta, que contou com apoio da Sephora, sapatos My Shoes e Budweiser, demonstrou seu poder em uma vibrante coleção.

A cantora Isabela de Almeida, a Bebé, apresentou-se acompanhada do musicista Igor de Melo Loureiro.

 Samuca fez uma participação poética emocionante, seguida por um impactante número de dança e música com artistas da Orquestra Sinfônica do Paraná e dançarinos convidados. A OSP abriu ao som do berimbau, dois  violinos e viola com as músicas de Sandra de Sá (“Meus olhos coloridos”) e Nina Simone (“Feeling Good”).

Bailarinos clássicos e contemporâneos ocuparam o palco com gestos e movimentos precisos, ricos em  potência e energia. O figurino é do acervo ªfløra de Leonardo Lino.

A dança afro marcou presença com o solo marcante de Isy Bato, o grupo “Kizomba in Curitiba” e as apresentações performáticas de Ira Dorsey, Luca Salvatore e Kisha, com a Cultura Ballroom ao som do DJ Hu’y Ãnga.

DEPOIMENTOS

“Pra mim o palco é esse lugar de entretenimento, vivências, poesia, um lugar de fala, representatividade, luta e persistência. Foi importante juntar todos os artistas nesse palco imenso, cada um com a sua singularidade dentro do coletivo”.  Luana Nery. 

Cleverson Cavalheiro, diretor-presidente do Centro Cultural Teatro Guaíra, concorda: “foi um espetáculo representativo e multiartístico. As várias formas de expressão, desde mídia, dança de salão e até desfile de moda, com um visual completamente inusitado, deram um tempero artístico muito bonito. Vários grupos estavam representando essa data tão importante”. Cleverson Cavalheiro, diretor-presidente do Centro Cultural Teatro Guaíra

“Esse projeto é uma semente linda. Agora nós temos que regar e esperar que a floresça para colher os frutos. Com fé e orgulho, pois os pretos e pretas estão se amando”.  Leonardo Lino.

“Foi uma honra contar com tantas influências pretas nesse que foi um momento histórico. Eu me sinto profundamente orgulhoso de estarmos gerando esse projeto tão precioso. Que ele continue transformando o futuro de muitos artistas pretos”. Rodrigo Leopolldo.

Créditos do post: Kraw Penas e Maringas Maciel