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por Nereide Michel em 27/01/2015

O curitibano Alexandre Linhares é tido e havido como um designer que dialoga tão intensamente com as propostas embutidas nas artes, entre estas a atemporalidade, que rotular suas criações com definições da moda trivial é perda de tempo. Não faz sentido. Prefixos como “anti”, “contra” se encaixam como luva ao conceito costurado em sua grife, Heroína, que abriga dedos de um jeito nada convencional, pois apontam para inusitadas direções. Antimoda, contracultura, contra a corrente… Alexandre Linhares segue a bússola do seu olhar para expressar, instigar, contestar o que vê ao redor, antes de, como um artista, passar suas observações – ou contestações – para os tecidos de suas roupas. Não surpreende  vê-las, com frequência, penduradas em galerias de arte ou desfilando por passarelas performáticas.

A Heroína completa uma data emblemática – cheia de significados para os místicos – 7 anos. Como a grife fala por si nada melhor do que “a sua voz” para contar como tudo começou e por que este “tudo” não se completa já que é desejo do seu criador manter fios e agulhas de prontidão para o que está por vir. Como diz, confirmando a sua permeabilidade a imprevistos, “não quero afirmar que minha coluna dorsal é uma haste de concreto, mas sim que o foco da minha visão não desvia o olhar daquele ponto cintilante lá na frente, da estrela Dalva, que guia o meu remar, desviando a rota de sereias sedutoras.”  Na definição do designer  as figuras mitológicas significam  o cantar fácil da moda como tendência igualadora do que se veste.

Thifany, mulher, musa, heroína de Alexandre Linhares, fotografada por ele, no primeiro ano da Heroína, na casa da mãe do designer. Segundo sua interpretação  a imagem “ exprime o que eu acredito como beleza, como técnica, como luz, como enquadramento. “

HEROÍNA, SETE ANOS, SEGUNDO ALEXANDRE LINHARES:

ANO 1

“A foto que marca o primeiro ano, tem estampada a figura do Lano, o “cara” que antes da Heroína – Alexandre Linhares nascer eu desejara para o catálogo “de quando eu tivesse uma marca”.  Mostrei pra minha amiga Bruna a capa do disco “maria”, da Maria Bethânia e disse que queria fotografar naquele lugar. Ela me respondeu: “Ale, eu conheço esse lugar”! “

ANO 2

 “O segundo ano tem a Thifany  fotografada por mim num momento em que eu queria como cenário um heliporto ambientando o 3º ato de “Heroínas Aladas”. A não autorização para uso do espaço, mais uma ousadia de produção, reforça a emoção refletida na imagem que a Thifany não entende porque gosto tanto, mas que eu adoro!”

 ANO 3

“Neste terceiro ano, vi num casamento da família da Thifany,  a Dona Cila: uma senhora de 90 anos e, sem dúvida, uma das mulheres mais lindas que eu já vi. Foi depois de ver o seu rosto que eu comecei a idealizar “sim,sim,sim”-  talvez uma das coleções mais profundas que eu já fiz. Ela trata da bagagem que carregamos nas costas, das marcas no rosto e das cicatrizes no coração. “sim,sim,sim” pode ser considerada a figura da mulher no casamento, a sua entrega e o quanto se anula pelo beneficio do todo. Vi que a Dona Cila representa isso. Vi que a Dona Cila representa “sim,sim,sim”. Vejo agora que essa união representa o nosso 3º ano.”

ANO 4

“Depois de ter feito “sim,sim,sim”, e no desejo de firmar a produção como um genuíno trabalho de arte, compusemos “sem titulo, °1 ou autocurta”. Esta foto foi feita pela Gio Soifer  no ateliê da sua avô Guita, tendo a Livia Deschermeyer como modelo. A Livia passou então a fazer parte da nossa vida.”

ANO 5

“O quinto ano tem novamente o rosto da Lívia, em fotografia da Gio Soifer. É de “à margem e à sombra” o vestido que olhei depois de pronto, pendurado na arara, e senti as glândulas lacrimais vivas. Me sinto tranquilo, pois hoje esta peça faz parte do acervo da nossa amiga Yara Zitronenblatt, exposto na parede de sua casa.”

ANO 6

“Foi o ano da nossa participação na Bienal de Arte de Curitiba, foi o ano em que conheci a Laurinha e a fotografei com máquina descartável no Passeio Publico. Foi o ano em que  fotografei dentro da fábrica de estátuas de gesso que já foi do João Turin. A foto que representa este ano intenso em vivências e experiências é da Maitê Schneider, desfilando na casa de chá The Kettle, e faz parte da coleção que homenageia o monstro da música, Jô Marçal. O tecido da roupa veio da cortina do ateliê da Heroína, que está com a gente  desde a inauguração do espaço. A estampa que ele carrega foi feita pelo sol, atravessando a grade diariamente, iluminando e arejando o local de inspirações e realizações. É como se o sol penetrasse a pele e o desenho da renda marcasse o corpo.”

ANO 7

A foto é a Thifany, fotografada por mim, para o catálogo da exposição “êxodo botânico”. Este catálogo foi costurado à mão, numerado e assinado. Foram apenas 10 cópias. A mim não restou nenhuma.”

Histórias completas dos capítulos dos anos de Heroína, aqui narrados por Alexandre Linhares, podem ser conferidas na íntegra no site www.h-al.com

O endereço físico do atelier Heroína, aquele onde está a cortina penetrada pelo sol, fica na Alameda Prudente de Moraes, 445, Mercês. O fone (41) 3233-4810.