Linkultura

por Nereide Michel em 25/01/2018

 “Curitiba no Tempo do Jazz Band”, obra do jornalista Adherbal Fortes de Sá Júnior, são capítulos afinados do cenário musical curitibano nas décadas de 60 e 70. O livro, lançado no sábado, dia 27 de janeiro, em um dos marcos históricos da cidade, o Paço da Liberdade, é um resgate mais do que necessário de personagens que com os seus instrumentos e vozes deram ressonância nacional ao que era produzido na capital dos paranaenses.  Editado pela Artes & Textos, o livro usou parte da pesquisa realizada para o projeto cultural “Vestido Branco, Uma Aventura Musical”, assinado por ele em parceria com a jornalista Miriam Karam.

Como esclarece o autor, “não se trata de um livro histórico, mas um livro de muitas histórias muitas histórias da música produzida em Curitiba e dos músicos que ajudaram a escrever a história da cidade com notas musicais. “ E histórias é que não faltaram para preencher as páginas “sonoras” de “Curitiba no tempo do Jazz Band”. Graças ao ciclo do café, um dos mais importantes da economia do Paraná, que atingiu o auge na década de 1960, acompanhado de uma explosão demográfica e de desenvolvimento social para o estado, o palco se armou para receber grandes instrumentistas, compositores e cantores, transformando Curitiba em um grande centro musical.

Como narra Adherbal Fortes, “havia bons músicos e orquestras bem afinadas. Cada emissora de rádio tinha orquestra e conjunto regional. Clubes, cafés, restaurantes e hotéis procuravam músicos. A demanda maior era das casas noturnas, que se multiplicavam no centro da cidade. A cena ganha efervescência durante um quarto de século, que começou em 1950, com a eleição de Getúlio Vargas, e as festas do centenário da emancipação política do Paraná. A festa de jazz e bossa nova só perdeu o brilho quando a geada negra de 1975 devastou praticamente a totalidade dos pés de café existentes no estado.”

PERSONAGENS AFINADOS

Entre os muitos artistas com história registrada por Adherbal Fortes estão nomes que alcançaram projeção nacional e internacional. Entre estes, Raul de Souza, mestre imbatível no trombone de válvula, considerado pela revista DownBeat um dos maiores do mundo. Ele era um dos 20 músicos do Rio de Janeiro que, no final dos anos 50, foram recrutados para formar a Banda da Base Aérea da Aeronáutica em Curitiba. Durante o dia, os “cariocas” tocavam dobrados militares. À noite, tiravam o uniforme para formar a Orquestra 14 Bis para tocar bebop e cool jazz nas rádios Guairacá e Clube Paranaense.

A 14 Bis concorria com as orquestras de Genésio Ramalho e Angelo Antonello nos bailes da cidade. Já a orquestra do maestro Beppi (Giuseppe Bertollo) era exclusiva da Caverna Curitibana, imenso “taxi-girl”, com salão de 600 metros quadrados, que funcionava no porão do Clube Curitibano.

No livro, Adherbal também relata as carreiras de Breno Sauer, que montou um quinteto inspirado no vibrafone do Modern Jazz Quartet e fez sucesso em Curitiba e São Paulo (Boate Oasis, Baiuca e La Vie em Rose), seguindo depois para o México e Estados Unidos, e de Gebram Sabbag, que Luizinho Eça e outros craques consideravam o maior jazzista do Brasil. Mesmo com esse título, Sabbag nunca aceitou convite para sair de Curitiba.

 A pesquisa original para o projeto “Vestido Branco” e que foi usada para a redação do livro consumiu oito anos de trabalho. As 300 entrevistas com músicos, empresários da noite e frequentadores das rodas de jazz e bossa nova foram feitas por Susy Murakami, Felipe Laufer e Murilo Alves Pereira. O resultado revelou que o Brasil musical de 1960 era um arquipélago, sem comunicação entre as suas ilhas. Raros talentos deixavam Curitiba para tentar o sucesso no Rio de Janeiro ou em outros centros, como aconteceu com o Quarteto Bitten-4, liderado por Palminor Rodrigues Ferreira, o Lápis, que se apresentou para uma plateia de 30 mil pessoas no Maracanãzinho, na final do Festival da TV Excelsior.

Adherbal Fortes trabalhou em jornais e televisões de Curitiba e foi coautor, com Paulo Vítola, dos musicais “Cidade Sem Portas” e “Terra de Todas as Gentes”, o primeiro encenado durante um ano no recém-inaugurado Teatro do Paiol e o segundo escrito para reinaugurar o grande auditório do Teatro Guaíra, em 1975.